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Duas resoluções do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (Cremerj) contrárias à participação de médicos em partos naturais serviram para reforçar ainda mais o movimento nacional pelo parto humanizado que cresce no País. Manifestações em diversas cidades brasileiras, inclusive em Jundiaí, onde dezenas de gestantes se reuniram na Marcha pela Humanização do Parto no domingo (5), mostraram que o tema tem respaldo da sociedade.
A Justiça Federal no Rio de Janeiro suspendeu os efeitos das resoluções do Cremerj mas as manifestações com a presença de um grande número de pessoas e ampla cobertura da mídia serviram para colocar o foco em um fato ainda pouco discutido pela sociedade: no Brasil, 90% dos nascimentos nos hospitais particulares é realizado através de cesárea e poucos ainda são os hospitais empenhados em humanizar o seu atendimento.
Thiana Andreotti Ferrarezi (primeira à esquerda na foto), ativista do movimento pelo parto humanizado em Jundiaí, e uma das organizadoras da marcha, diz que há um crescente interesse pelo assunto na cidade.
“Aqui em Jundiaí estamos começando. Atuo há um ano e, para quem começou da estaca zero, estamos caminhando. No domingo (5) participamos do movimento nacional, a Marcha pela Humanização do Parto, pedindo por uma assistência mais humanizada para as mulheres nesse momento especial que é parir e nascer de um bebê. As pessoas estão chegando, e estamos formando uma rede”.
Thiana afirma que não existe uma resistência declarada dos médicos de Jundiaí contra o parto humanizado, mas constata que na cidade não existe qualquer profissional que acredite e apóie o parto natural sem intervenções.
“Aliás, as taxas de parto normal aqui são baixíssimas. Os médicos são cesaristas ao extremo”.
O que agrava a situação, segundo ela, é que não existem em Jundiaí hospitais preparados (com equipe) para um parto natural humanizado.
“Quando a mulher não se informa, eles aproveitam e marcam a cesárea dizendo que ela ou o bebê têm algum problema. Não dão opção pelo parto natural. Isso, de certa forma, acaba gerando um movimento de parto domiciliar”.
Thiana realiza encontros com gestantes aos sábados, trabalha na preparação física e emocional para parto e pós parto, amamentação, cuidados com bebê. E é doula (acompanha mulheres em partos hospitalares e domiciliares).
Recentemente, Thiana Ferrarezi, que é professora de yoga, deu uma entrevista para Flavia Gattolini, do programa de televisão Notícias do Bem (Canal 25) onde explica o que é o parto humanizado e o trabalho como doula, a acompanhante da mulher gestante. A entrevista foi transcrita com autorização da autora.
O que é o trabalho como doula?
“O trabalho como doula é informar a mulher a respeito da importância de uma gestação consciente e das possibilidades de um parto como uma vivência transformadora. E acompanhar a gestante durante a gestação, durante o trabalho de parto e depois no pós-parto também”.
Mas como é isso na prática? No momento da convivência com a gestante?
“É acompanhar a mulher durante o trabalho de parto oferecendo a ela alívio nos momentos de maior dor. E esse alívio não é com medicamento. É com massagem, com carinho. Com palavras de apoio. Se ela precisa de uma massagem, se precisa de um carinho, de uma palavra, de uma bronca… Enfim, cada mulher precisa de algo específico. E durante o trabalho de parto a doula dá esse suporte emocional e afetivo.
Como é o trabalho realizado com as gestantes?
“As gestantes que fazem aula de yoga comigo eu encontro semanalmente e, ao longo da gravidez, vamos nos conhecendo. Eu transmito as orientações sobre o período de gestação e sobre o parto. As mulheres lêem muito. Então elas tiram muitas dúvidas aqui. E a mulher que não faz yoga comigo eu encontro algumas vezes (pelo menos de quatro a cinco vezes) durante a gestação, de acordo com a necessidade dela, para criarmos um contato, uma afinidade. Todas as mulheres que acompanho como doula prefiro que seja desde o começo da gestação. Ou no máximo com 25 a 26 semanas. Mais que isso já fica mais difícil da gente criar um contato.
Quais as informações específicas você passa a elas?
“Geralmente é sobre os benefícios do trabalho de parto, da vivência do parto natural, que é o parto que acontece sem a intervenção nenhuma de qualquer médico. Sobre o empoderamento da mulher, que é ela acreditar que pode parir. Que quem faz o parto é a mulher, não é o médico, não é a doula, não é ninguém. É a própria mulher. É a mulher resgatar de dentro dela essa força, essa coragem e essa sabedoria.
Antigamente todas as mulheres tinham filho em casa. Hoje em dia maioria faz o parto no hospital. Qual a diferença entre a criança que nasce no hospital e a que nasce de parto natural? Você consegue enxergar essa diferença?
“Existem muitos estudos, muitas pesquisas científicas que já têm esses números. Uma criança que nasce de parto natural tem os reflexos, a parte neurológica bem mais desenvolvida. Isso não quer dizer que uma criança que nasce em hospital, de parto normal ou cesárea, não tenha essa parte desenvolvida. A diferença é que durante o trabalho de parto natural a criança faz muito esforço. Um esforço positivo que acaba ajudando a criança durante a vida”.
“Então, no tempo da criança, no tempo da mulher, o trabalho de parto vai acontecendo. A criança vai achando o caminho pra nascer. Ela fica de cabeça para baixo e isso faz com que toda a parte mais alta da cabeça, que se encaixa no momento do nascimento, ative a parte neurológica do bebê. Então é um bebê mais esperto. Uma criança que tem mais resistência no geral. Uma criança mais saudável também”.
Como é o empoderamente da mãe durante a gravidez?
“É ela superar seus medos. Porque geralmente todas elas têm muito medo. Eu ouço muito: eu vou fazer cesárea porque eu tenho medo. Aí é que entram as informações: o que é um parto cesárea? Quanto optar por um parto cesárea? O parto normal e o parto natural. Geralmente é muito óbvio a mulher optar pelo parto natural. Se ela se conhece. Se ela conhece seus medos. Se ela enfrenta. O parto ajuda a mulher a vivenciar o processo de ser mãe. A mulher passa pelo parto e sente a transformação para ser mãe. É diferente de um parto feito pelo médico. Esse empoderamente não sou eu quem faz. Eu ajudo a mulher a se conhecer e a identificar dentro dela essa capacidade que vem com todas as mulheres”.
Essa mulher se torna uma leoa, uma guerreira…
Quem passa pela vivência do parto me relata o seguinte (eu mesma tive essa vivência): Eu sou uma outra mulher. Eu sou uma outra esposa, eu sou uma outra amiga. Eu sou uma pessoa muito mais forte. Se eu passei pelo trabalho de parto e pelo parto eu sou capaz de tudo na vida. E, de fato, você começa a vivência com seu filho já de um outro lugar. No lugar de uma mulher mais madura, de uma mulher que superou os próprios limites e vira sim uma mãezona”.
Um outro estilo de mãe. Forte. Que ajuda a criança a se desenvolver.
“O elo formado por uma mãe que passa por uma gestação consciente (que é o tempo todo incluir o bebê nas suas tarefas diárias) e passa pelo trabalho de parto como uma vivência positiva já começa a maternidade. Porque o pós-parto é um período difícil para toda mulher. Bem difícil. Uma mudança na vida da mulher onde ela tinha que cuidar dela e de repente passar a ter que deixar de ser ela mesma por um tempo pra atender às necessidades do bebê. É uma mãe que com certeza dá muito mais suporte pro filho.
Quando uma mulher escolhe fazer o parto natural, como é isso pra ela?
“Ela tem que procurar uma equipe médica ou parteira que acompanhem o parto natural. Se for médico ele pode acompanhar o parto natural domiciliar ou hospitalar. E se for uma parteira é o parto domiciliar. Não é qualquer médico que é a favor do parto natural. Existem as equipes certas. Há médicos em São Paulo e em outros estados. E são poucos os médicos que se colocam nesse lugar de a mulher fazer o parto e não o médico. Então ela tem que procurar uma equipe humanizada, uma equipe de parto domiciliar”.
Mais informações
www.facebook.com/marchapartohumanizado
www.yogaparagravida.com.br
http://partonaturaljundiai.blogspot.com.br/