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Doze fotografias tentam tornar visível o medo que toda grávida no Brasil sente de contrair doenças transmitidas pelo aedes aegypti, principalmente o Zika virus.
Essa é a proposta da exposição virtual Invólucro da fotógrafa Marília Scarabello. Ela mesma explica:
“A ideia veio em um dia, no verão passado, quando vi uma grávida na minha frente na fila do caixa de uma farmácia em São Paulo. Ela parecia agitada, inquieta. Foi quando reparei na cestinha de compras dela: eram só repelentes, uma imensa quantidade e ela aguardava mais unidades vindas do estoque da loja”.
“Naquele momento traduziu-se dentro de mim toda a insegurança, todo o medo e, ao mesmo tempo, toda a loucura que era a tentativa de se cobrir de roupas em pleno verão de um país tropical, e camadas e mais camadas de repelentes para tentar evitar um desfecho indesejado e perigoso, capaz de mudar para sempre os sonhos e a vida de muitas pessoas”.
“Não enxergamos os repelentes, mas eles estão ali envolvendo-as junto com todas as outras preocupações e inseguranças normais. A gente se envolve com eles também e tal como elas torcemos para que seja suficiente”.
“Como tornar o medo visível? Como levar essa proteção ao limite? Como expor o que se opera dentro delas, que as torna especialmente mais vulneráveis diante de uma situação que chega a ser surreal? Como expor esse fantasma que as acompanha dentro de suas rotinas normais?”
“Esse trabalho foi a resposta que encontrei para a questão que se impôs para mim naquele dia dentro da farmácia. Eu espero que ele só reforce a necessidade que temos de refletir sobre o tema, de acabar com criadouros, estar atentos, ao mesmo tempo que reforce também o absurdo, dentro de tantos absurdos que temos que enfrentar diariamente no Brasil por conta da falta de comprometimento do próprio brasileiro com tudo o que o cerca”.
“Cabe pensar também no crescimento desordenado das cidades que só desequilibram ainda mais o meio ambiente, facilitando o surgimento de epidemias. Temos ferramentas para agir diferente e não tornar nosso próprio território, que é a nossa casa, um lugar inóspito para viver”.
“A série foi realizada em São Paulo com uma grávida de verdade que topou a empreitada justamente por viver essa situação e perceber a importância de se colocar a questão em evidência.
“Não podemos esquecer que este mosquito já carrega três vírus diferentes e possui grande potencial de tornar a febre amarela uma epidemia urbana. Não podemos tratar como algo normal situações que poderíamos resolver. Este trabalho é sobre isso.
O medo diluído na rotina massacrante da cidade
O que você busca?
“Eu busco fazer o que eu sinto necessidade de fazer para me sentir viva.
É isso que te move?
Sim. Sou envolvida com arte desde pequena. Não é uma escolha, é uma necessidade. Esse trabalho não teve verba nenhuma. Eu fiz porque quis, precisei fazer. Eu tenho usado muito a fotografia para me expressar, tem sido meu meio.
Algo a ver com momento pessoal a escolha do tema?
Nada alem do que escrevi. Na fila de uma farmácia vi a aflição de uma grávida na minha frente e pensando sobre isso tive a ideia.
De pensar a paranóia, os fantasmas, o medo como um fantasma e ao mesmo tempo a loucura que temos que viver diariamente como se fosse algo rotineiro, banal, mas que beira o absurdo.
Banal que beira o absurdo…
Porque em geral nós brasileiros não tomamos as medidas simples que evitariam que este mosquito proliferasse
O absurdo vira banalidade. Não é?
Sim.
E passividade também…