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Uma nota pública da administração da cidade na segunda-feira (11) esclareceu que a apresentação da peça teatral “A Princesa e a Costureira” segue a lei municipal 11.770/2015 de promoção de direitos humanos, não é direcionada ao público infantil e que faz parte da 4ª Semana da Diversidade Sexual, proposta pela ONG Aliados.
O curioso esclarecimento, na verdade, é uma reação contra um pedido de censura.
A acusação de que seria direcionada ao público infantil usou um portal evangélico da empresa Gospel Prime Ltda, descrevendo o roteiro da psicóloga Janaína Leslão como um “conto de fadas gay”. O alarme teve mais de 2 mil apoios virtuais, mas não há como saber quantos são verdadeiros ou quantos são residentes na cidade.
Embora com protesto direcionado para a Prefeitura, o apoio da montagem de profissionais de teatro na verdade foi do Governo do Estado. E o horário da apresentação (segunda, 18, às 19h00) no espaço cedido da Sala Jundiaí, no Complexo Fepasa, também não é destinado a crianças.
Mas e se fosse em horário diurno, para um público infantil acompanhado de seus pais, qual seria o problema? Em uma cidade às voltas com grandes problemas no Hospital São Vicente ou no Hospital do Grendacc, o motivo da polêmica em torno de uma peça que desmonta o final feliz apenas de príncipe e princesa parece exagerado.
É reflexo, todavia, do que diversos estudiosos apontam como “guerras culturais”. O conceito, surgido nos Estados Unidos, define um processo ligado com a polarização política que reduziu o diálogo coletivo nos últimos anos, fazendo até mesmo grupos nas redes sociais serem configurados apenas para a concordância.
O fato ocorre na mesma semana em que no plano nacional estourou a polêmica do Santander Cultural, em Porto Alegre, que cancelou uma exposição chamada “Queermuseu” sob pressão de grupos ligados ao Movimento Brasil Livre (MBL), causando uma onda de perplexidade de artistas em todo o país, mesmo daqueles que não gostaram da exposição.
Completando o circuito, o braço local desse movimento também protagoniza outra frente nessas “guerras culturais” com o projeto da Escola Sem Partido, em apoio de diversos vereadores, na Câmara. Mas teve a tramitação suspensa por trinta dias desde 29 de agosto, após protestos de movimentos sociais. A proposta também é apontada como inconstitucional por setores da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que em Campinas também obteve a suspensão.
A aliança entre setores liberais na economia e reacionários nos costumes é uma variante própria do liberalismo à brasileira em sua frente com setores fundamentalistas ou de grandes ruralistas. Isso embaralha a renovação nos setores mais democratas, inclusive contra o extremismo contrário ao que se chama de homofobia (colocada ao lado do racismo, sexismo e outras formas de exclusão social). .
O ponto, entretanto, é que a censura não é mais apenas estatal. Com as novas táticas, também empresas e instituições podem cada vez mais restringir o apoio a propostas menos comerciais. Esse é o cenário das “guerras culturais” geradas no lugar do convívio.
Mesmo restritas a um percentual limitado da população que se dedica ao debate político, de um lado ou de outro, devem reproduzir com atraso um processo já visto em países como os Estados Unidos. A diferença é que cresce no meio de uma crise econômica, em ambiente institucional mais frágil e na véspera de mais um ano eleitoral. .