Cantora, compositora, produtora cultural e funcionária pública aposentada após 37 anos de serviço na Prefeitura de Jundiaí, Clarina Fasanaro assumiu, em 1º de janeiro, a Unidade de Gestão de Cultura – que no novo governo voltará a se chamar Secretaria da Cultura.
Na sexta-feira, dia 10 de janeiro, Clarina recebeu em sua Sala no Espaço Expressa, o jornalista Flavio Gut, para uma entrevista onde falou das prioridades de sua gestão. Clarina apresentou como destaque a criação de uma divisão de ações culturais descentralizadas, com o objetivo de levar a cultura para mais perto das comunidades nos bairros da cidade.
Essa proposta, que busca fortalecer a cena cultural local e atender às especificidades de cada território, prevê o mapeamento de manifestações artísticas espontâneas e a integração de jovens e comunidades às atividades culturais.
O modelo terá início com um projeto piloto, que estabelecerá polos estratégicos em pontos já estruturados, como centros comunitários e escolas, utilizando parcerias para otimizar recursos e ampliar o alcance das ações.
Além disso, Clarina ressaltou a importância de captar recursos por meio da iniciativa privada e de leis de incentivo, como a Lei Aldir Blanc, para garantir a manutenção dos Corpos Artísticos de Teatro, Dança e Música (Orquestra Sinfônica Municipal de Jundiaí – OSMJ), vinculados à Unidade de Gestão de Cultura.
Acompanhe a entrevista

Agora, à frente da Secretaria da Cultura, como a senhora avalia o que foi realizado, especialmente durante os oito anos da gestão Luiz Fernando Machado e ao longo dos anos anteriores?
Olha, a partir de 2012, especificamente. E eu vou estabelecer um panorama, porque houve realmente uma mudança na forma de conduzir. Por quê? Porque começou num pensamento de uma abertura de espaço democrático para os artistas.
E realmente a própria sociedade foi se apropriando dos seus direitos ao longo da vivência da nossa Constituinte de 88. A Constituição traz aqueles princípios de igualdade de oportunidades e uma série de outras coisas, e as políticas públicas passaram a ter essa preocupação.
E isso se deu a partir de 2013 e veio num crescente, inclusive de aprimoramento desses mecanismos. Por exemplo, o cadastro de artistas. Eu comecei a trabalhar no cadastro de artistas – estou falando assim enquanto servidora. Eu fui servidora pública por 37 anos, trabalhei na Secretaria de Cultura de 2014 até o final de 2019.
Então eu participei ativamente da elaboração e no processo de criação do cadastro de artistas. E esse cadastro, embora ele tenha sido elaborado na gestão do Pedro Bigardi (prefeito de Jundiaí de 2013 a 2016), ele foi lançado pela pela Vasti (Vastí Ferrari Marques, gestora de Cultura entre janeiro de 2017 e outubro do mesmo ano).
(O Cadastro de Artistas é uma ferramenta desenvolvida pela UGC em parceria com a Companhia de Informática de Jundiaí (CIJUN) através da qual os artistas da região podem divulgar seus trabalhos e projetos para consulta tanto do público em geral, quanto da Prefeitura. É através dele que são realizadas as contratações, via editais, das propostas artísticas que compõem a Agenda Cultural programada pela UGC, como a Sexta no Centro, Sexta no Museu, Cultura nos Bairros; festas e festivais, como a Festa da Uva e ExpoVinhos, além das atrações apresentadas em espaços como a Fábrica das Infâncias Japy e a Biblioteca Municipal Professor Nelson Foot.)
Foi logo no início da gestão dela na Cultura em 2017, não é?
No início, quando a Vasti assumiu a Cultura, o cadastro estava pronto e foi lançado. E, concomitante com isso, a Cultura tinha essa preocupação de abrir os editais para todos terem a oportunidade democrática de participação.
Em 2012 foram criados corpos artísticos e eles permaneceram atuantes na cidade.
Corpos artísticos municipais: Cia. de Teatro de Jundiaí, Cia. Jovem de Dança, Coral Infantojuvenil Cidade das Crianças, Coral Municipal de Jundiaí e Orquestra Sinfônica Municipal de Jundiaí.
A vinda para cá (Espaço Expressa, antigas Oficinas da Cia Paulista das Estradas de Ferro), trouxe mais um espaço cultural, que é um lugar muito bonito, mas é um espaço que carece de melhorias, que depende de um recurso que a prefeitura nunca vai ter, porque isso aqui é um patrimônio tombado, é revitalização, o custo é muito alto.
Agora, o Centro das Artes foi entregue com uma sala de espetáculo, a Glória Rocha, e com a sala Josete Feres, que é uma sala multiuso, mas a gente pode considerar que ela pode receber espetáculos pequenos. O saguão do Centro das Artes foi equipado para ter shows e outras atividades.
Então realmente a cultura vem num crescente no cenário dos últimos anos.
O problema é que a gente entra com ideias e com projetos novos, mas nós vamos ter que ter uma análise, um planejamento muito preciso pela frustração de receita que nos impõe um recurso 30% menos que nos anos anteriores.

Como é possível trabalhar com uma redução de 30%? É possível ter o desenvolvimento, por exemplo, dos corpos artísticos com essa redução?
Nós vamos nos reunir com os corpos artísticos.
Especificamente em relação a orquestra municipal tem uma Lei Rouanet aprovada para incentivar. Agora resta ir buscar esses recursos junto às empresas.
Mas existe um entrave nessa relação, porque a Prefeitura não pode inscrever projetos na Lei Rouanet. Mas a fundação pode. Nós temos a Fundação Casa da Cultura, Esportes e foi através dela que foi feita a inscrição desse projeto. Mas para gerir uma prestação de contas de uma Lei Rouanet, é um trabalho muito específico, que tem que ser profissional para fazer isso.
E, segundo informações que eu obtive, esse trabalho para prestação de contas estaria contemplado no projeto. Mas eu preciso me debruçar sobre isso. Nós vamos ter que chamar as empresas para apresentar o projeto e tentar obter esse recurso.
Você perguntou se é possível manter os corpos artísticos com um corte de 30%? Eu não tenho essa resposta porque quem vai me dar essa resposta são os diretores dos corpos artísticos. Porque a minha ideia para que a gente consiga manter essas políticas é justamente fortalecer a Fundação (Casa da Cultura e Esportes) e buscar vias externas para a obtenção de recursos.
E essa obtenção de recursos é para manutenção, por exemplo, do Espaço Expressa e dos corpos artísticos?
Não, não necessariamente. Porque a própria Fundação tem uma pertinência e abarca alguns equipamentos públicos de cultura e outros não.
E aí cabe um entendimento exato dessa legislação e talvez até uma revisão dela – inclusive para o esporte, que está dentro dessa fundação, mas atualmente não faz uso dela.
Então o problema agora é estruturar essa forma de fazer. Essa estruturação depende da Cultura, mas a gente quer uma parceria com desenvolvimento econômico (Unidade Gestora de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia) e o envolvimento do alto escalão do governo no entendimento dessa necessidade pra gente obter recursos de fontes externas, porque, senão, nós teremos um problema
Vamos pensar: 30% menos recurso. Aqui (no Expressa) temos um contrato de segurança, porque a gente precisa ter uma segurança noturna para não ter invasão. Nós temos também de administrar o estacionamento do Expressa.
Esse custo, ele impacta diretamente. E será que haverá uma empresa que aceite receber 30% menos na renovação de um contrato? A gente vai conseguir negociar uma redução de 30% a menos?. Então, a gente entende que vai ter que haver muito planejamento para entender o que nós podemos fazer com o que temos, sem ter grandes perdas nos projetos culturais.
Toda a manutenção do espaço, desse Espaço Expessa, e dos outros espaços de cultura estão dentro do orçamento, da cultura?
Sim.
E o valor de manutenção dessa área aqui eu imagino que é bem alto, não?
Não. O valor previsto no orçamento é baixo.
E esse valor de manutenção, que poderia estar sendo investido em outras áreas da cultura, vai acabar drenando recursos que poderiam ser usados para pagar artistas, como em produções de peças de teatro?
É isso mesmo. Ele vai drenar recursos porque…
Ah, vou dar um outro exemplo: a educação tem um recurso vultoso, mas ela faz a manutenção das escolas.
O problema da Cultura é que é assim: quando a Secretaria de Cultura era em cima lá do Banco Santander (a Casa da Cultura funcionava no segundo andar no prédio do Banco Santander no Centro da Cidade) a gente administrava aquele espaço.
Depois tinha uma outra locação para a Casa dos Conselhos, tinha o Polytheama, o Centro das Artes. Tinha a Pinacoteca. Mas hoje a Cultura tem Pracinha da Cultura, que é no bairro Vista Alegre, que também tem que manter. Na gestão retrasada, a biblioteca (Nelson Foot) foi incorporada à Cultura também. E tem a Fábrica das Infâncias, que também é um espaço que a Cultura gerencia.
Só que o orçamento da Cultura, a divisão é por percentuais. Cada secretaria tem um percentual no orçamento. E o percentual da Cultura não subiu por conta dessas aquisições de equipamentos públicos.
Então isso impacta diretamente.
Quer dizer que o fato da Cultura ter mais, digamos assim, lugares para apresentações, mais lugares onde a cultura pode estar disponível, tirou a capacidade de se contratar artistas para estarem nesses lugares, é isso?
Sim. E também tem a questão do corpo de servidores. Então é aquela velha história:
Quando uma gestão resolve construir uma escola, o custo da escola é o menor problema. O problema é colocar professor merendeira. E aí o custo passa a ser um custo eterno. A construção não. Você pega o montante e faz, mas o custo de manutenção de tudo aquilo, é um custo continuado, entende? Então, crescer exige estrutura.

Isso vai exigir que se faça uma mudança do orçamento municipal?
Nós executamos esse ano o orçamento elaborado no ano passado pela gestão anterior e aprovado pela Câmara.
Então, quando a gente pensa numa redução…
Por exemplo, se você pensar numa redução de 30% na saúde é um impacto na vida das pessoas de forma devastadora, quando você pensa que nós precisamos mais recursos, vai ter que sair de alguém. Não tem milagre. Então, a saída é buscar novas formas de fazer e obtenção de recursos que venha da iniciativa privada também.
Hoje nós temos uma coisa muito acertada, que são as leis federais que depositam recursos no Fundo Municipal de Cultura para fomento. E essa é uma fonte de recursos externa que ajuda bastante.
Isso é a lei Paulo Gustavo?
A lei Aldir Blanc. E foi também a lei Paulo Gustavo foi durante um período. A Paulo Gustavo foi pontual porque ela era do audiovisual.
Então existia um recurso grande, vinculado ao Fundo Fundo Setorial do Audiovisual (FSA). Inclusive aqui no Expressa, com o recurso da Paulo Gustavo, foi feita a sala de cinema.
Mas Aldir Blanc não. Aldir Blanc é uma política continuada, de incentivo. Portanto, até 2027 é para a gente receber esses aportes. E aí quem gerencia o recurso, é a Cultura. E gerenciar esse recurso impacta administrativamente a Cultura, porque ela faz os editais, contrata a banca de jurados, faz toda a gerência até chegar no momento realmente da seleção do projeto artístico, onde o artista recebe o recurso e ele executa seu projeto com total independência.
Então quer dizer que a grande aposta para se continuar a ter um cenário cultural crescente na cidade são esses aportes dessas leis e também da iniciativa privada?
… e também o recurso que a gente vai tentar economizar, sanear, tirar leite de pedra pra fazer, né?
A gente tem um departamento dentro da Cultura que é estrutural, é um departamento de gestão, planejamento e finanças. Então a gente precisa planejar, porque nós temos o ano inteiro com ações. Temos que planejar e tentar formas de fazer com menos custos. A gente pode ter um trabalho muito bom, até com menos dinheiro.
Nós vamos concentrar esforços nessa linha.

E qual é que é o seu plano ? Qual é a sua visão para essa cultura de hoje e nos próximos quatro anos? O que ela muda com relação ao que vinha sendo feito?
Olha, tem vários projetos…
Vou pegar o Cultura nos Bairros, por exemplo. O Cultura nos Bairros foi um projeto da gestão passada que não funcionou. Então, algumas coisas que eram feitas a gente tem condição de entender que talvez não tenha atingido os objetivos de forma satisfatória. E eu digo isso porque eu tive uma atuação muito próxima de tudo o que aconteceu, porque eu me aposentei no final de 2019 e eu passei a integrar o Conselho (Municipal de Cultura)
Então, nós temos o Enredança, que já é um projeto sacramentado. Nós temos o Festival de Teatro, o Festival de Curtas, o Encontro de Corais, o Festival de Música, nós temos a Semana do Patrimônio Histórico, nós temos várias ações.
Festival literário também?
A FLIJ (Festa Literária de Jundiaí). Então nós temos projetos que a gente quer manter. São projetos acertados e esperados pelos artistas.
Só que tudo isso depende de uma condição financeira de execução. Agora, o que, além disso, é a proposta?
É um projeto de criação de uma divisão de ações descentralizadas. Isso parte da estaca zero, porque essa política nunca existiu. Quer dizer, nunca existiu nos últimos anos. Mas é uma política onde a gente vai buscar escutar os jovens, movimentar a cena jovem e se inserir dentro das escolas num diálogo com a Delegacia de Ensino.
Mapear os territórios para identificação de espaços que possam receber ações artísticas, mapear as manifestações artísticas e espontâneas nos territórios. Porque muitas vezes, em determinado bairro, tem um bar da esquina onde as pessoas vão tocar chorinho no final de semana. E aquelas pessoas se reúnem, a comunidade gosta .. Ou, de repente, a gente tem uma escola de samba que tem um trabalho no bairro e aquilo já envolve, já tem um envolvimento da comunidade.
Nós temos projetos muito acertados como, por exemplo, o Grupo Sol (Grupo Sol da Cidadania). Eles já tem uma integração com a comunidade. Então, o objetivo é buscar justamente esses espaços para mapear as ações culturais espontâneas nesses territórios, para que a gente seja um facilitador dessas manifestações culturais.
Por outro lado, o Cadastro de Artistas é georeferenciado. Então, se vamos para o Novo Horizonte, numa ação descentralizada, eu tenho como levantar quais artistas tem ali no bairro para chamá los também.
Nos centros esportivos, por exemplo, tem grupos de ginástica e elas fazem coreografias para o festival de ginástica no final do ano. Então a gente vai lá e convidamos para se apresentar no nosso evento.
Esse pensamento de integração vai exigir um esforço nesse mapeamento de um departamento que eu tenho que criar e lançar como piloto, mas que é para ser uma construção ao longo dos anos, justamente pela falta também do recurso. Mas é um projeto piloto, isso vem como uma coisa nova.
Então vai ter um polo de Cultura em cada ponto estratégico da cidade? Um polo de ação cultural?
É. Por exemplo: nós temos o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil – MROSC , que é um instrumento de firmar parceria público privada.
Então vamos supor que você tem um centro comunitário dotado de toda a estrutura para ministrar oficinas. A gente pode estabelecer uma parceria de modo que a cultura entre com oficineiro e o centro comunitário absorva os custos do banheiro, do papel higiênico do funcionário que tem que abrir, Entendeu?
Sendo assim, a gente foge do modelo da gente ter que ter mais espaços para gerir tudo, para propiciar dentro da comunidade com que isso chegue para um espaço que já tem uma estrutura.
A Secretaria da Cultura será responsável pela gestão cultural e das apresentações, enquanto a parte de infraestrutura ficará sob responsabilidade do centro comunitário?
Exatamente. Então, dessa forma, a gente vai especificamente gerir a cultura dentro de um espaço.
O que a gente sabe é que assim: tem pessoas que não vão se deslocar para o centro da cidade. Muitas pessoas “penam” para ter o dinheiro do ônibus. Isso é uma realidade.
Por outro lado, os pais – antigamente a gente saía sozinho pela rua, brincava na rua. Hoje em dia os pais têm medo de soltar muito. Então tem esse problema. Se você atende um público de crianças de dez, 12 anos, eles não virão sozinhos. Então, isso, estar no bairro é uma coisa muito acertada, porque logisticamente propicia de fato a participação.
Isso vai ser implementado de que maneira? Começa com o projeto piloto em algum lugar?
Exato.
Já tem o lugar onde vai ser o primeiro?
Então, é o que eu estou falando: a gente parte da estaca zero.
Mas esse é o grande ponto, o ponto chave da mudança de visão?
Sim, ele é o ponto chave. Sim, ele é um ponto central.

Essa administração está dizendo que Jundiaí é uma cidade boa para morar e ela precisa ser também uma cidade boa para viver. Essa ação de descentralização da Cultura é parte dessa ideia?
Sim. Vem nessa linha. O convite, a razão porque eu estou aqui é justamente nessa linha, porque o Gustavo (Gustavo Martinelli, prefeito) ) me conheceu não como artista, mas como uma profissional da área da educação física, que tinha um trabalho no centro esportivo. Eu dava aula de vários esportes, mas eu fazia a festa, levava meu som, punha as criança pra dançar.
Uma vez eu recebi um Michael Jackson cover numa festa. Foi esse sensacional! Eu sempre tive esse sonho de usar os espaços públicos disponíveis nos bairros para ser um lugar para para esse tipo de ação.
Isso vale também para praças públicas? A gente já viu um pouco disso acontecer na cidade. Ou são eventos para lugares como centros esportivos e centros comunitários?
Olha, quando você vai para uma praça e você vai montar um palco, a coisa começa a encarecer.
Por que quem menos ganha na cadeia produtiva é o artista. Eu não estou falando num artista global, numa Ivete Sangalo. Estou falando de uma outra história, do universo que a gente vive. Se você pegar o custo da estrutura e comparar com o custo do artista, você vai ver que quem ganha mais é a estrutura. A estrutura mina mesmo.
Porque quando a gente fala de coisa pública, quando se coloca um palco, ele tem que ser seguro, ele tem que ser um palco anti-chama. Daí, de repente, você tem que ter acessibilidade ao palco. Você começa a agregar várias coisas que vão custar, entende? Enfim, é maravilhoso você chegar numa praça cheia de árvores ali e montar um palco e fazer.
É maravilhoso, mas eu vou pegar como exemplo o Sexta no Centro. Quando ele surgiu, foi em frente ao Solar do Barão, com uma estrutura de palco montada ali. vocês lembram? Eu lembro que ele foi para o coreto para não pagar o palco. O coreto não é um palco muito legal porque não se pode mexer nele também por questões históricas envolvidas. Tem uma grade em frente.
Então a gente fica atrás da grade…
Mas o coreto é uma saída. Tudo é válido no momento em que você quer fazer e aquilo que você tem e você vai entregar o que é possível.
O Sexta no Centro vai continuar a ser realizado?
Sim. A questão é planejar, porque o formato do Sexta no Centro também é interessante para ser levado para outros bairros.
Como falei, ainda não temos uma leitura exata do custo dessas ações. Aqui (Espaço Expressa) também é um lugar excelente para fazer esse tipo de evento, principalmente pelo estacionamento. Hoje em dia, ter um estacionamento disponível coloca o evento em vantagem no que diz respeito à participação.
E, ao colocar atividades para as crianças, elas ficam em um ambiente mais seguro, o que também é uma ideia importante nesse movimento.
Além disso, se pudermos concentrar eventos no mesmo espaço — por exemplo, o Sexta no Centro junto com um festival de música no Expressa — podemos usar a visibilidade de um projeto para divulgar o outro, com uma área de alimentação para atender ambos os eventos. A questão de ter alimentação e acessibilidade é fundamental, pois, ao participar de um evento, as pessoas querem tomar uma água ou comer algo.
E entra também a questão do Jundiaí Feito à Mão, que podemos trazer para essa proposta. Quanto mais conseguirmos agregar pessoas, seja com produtos alimentícios ou artesanato, mais público estaremos atraindo para o evento.
Está se falando de integração de espaços. Aqui no Expressa foi retirado do muro abrindo acesso para a avenida dos Ferroviários. Esse tipo de obra deve continuar?
Olha essas ações vêm com uma restrição de investimento. Não dá para falar sobre isso, porque isso depende realmente de investimentos. É assim é fracionado. Por exemplo, teve,um edital que consertou o telhado.
Então, de repente, se consegue um recurso para especificamente ele fazer a manutenção das partes de madeira. Porque assim, quando você tem um patrimônio tombado, não é reforma, é revitalização e tudo custa mais. Porque você não pode mudar. Se essa janela não fecha mais, vamos por uma de alumínio que não enferruja, que não pega umidade? Nada disso.
Tudo tem que ser muito bem estruturado e não pode mexer, entendeu? Então, é por partes. Essa é a questão. Eu estou aqui há, praticamente, oito dias. Você tira o final de semana, faz seis dias que eu cheguei e eu não tenho uma visão ainda, precisa sobre o andamento dessas obras e o que de fato elas englobam.
Mas eu com certeza eu posso dizer que não tem previsão de uma obra grandiosa de revitalização em curso,
Então, não há previsão de construção de novos espaços culturais em outras áreas da cidade? Pelo que entendi, a proposta é levar a cultura para esses locais, aproveitando as estruturas que já existem e criando essa integração, certo?
Não existe previsão. O Centro das Artes foi reformado através de um empréstimo. Não tinha recurso para para fazer o que foi feito lá, foi necessário um empréstimo.
É que é assim: tem o PPA, que é o Plano Plurianual – se a gente sonhasse que a economia desse um “boom” e que a arrecadação saísse pelas tampas, mesmo assim em função do percentual pequeno que a Cultura ocupa dentro do orçamento, é muito difícil a gente pensar em construção de novos espaços.
Na sua opinião, seria necessário construir novos espaços culturais na cidade, ou os existentes são suficientes para atender à demanda?
Em uma cidade com mais de 400 mil habitantes, temos apenas dois teatros. Isso faz com que a disputa pelo uso desses espaços seja grande, gerando muitos debates sobre como utilizá-los.
Há também outro problema: agora, o Glória Rocha está lá. Com a inauguração da Sala Glória Rocha e da Sala Josete (Feres), precisamos concentrar esforços para garantir que tudo o que seja realizado nesses espaços seja de fato arte. É necessário estabelecer um regimento que impeça o uso desses locais para atividades que não estejam relacionadas à sua finalidade.
Porque, por exemplo, não vamos fazer shows em hospitais, nem consultas em escolas, não é?. Cada espaço tem sua pertinência. E, como temos apenas esses dois teatros, eles precisam ser utilizados para a finalidade para a qual foram destinados. A concorrência é grande.
Não ser usado para a festa de formaturas, palestras, é isso?
Formatura de escola, por exemplo, cursos, oficinas. Nessa linha, conferências. Mas não, não é um espaço para essa finalidade. Isso mina a capacidade de absorver realmente espetáculos artísticos.
É um desvio de função?
Exatamente
Como é que vai ser feito esse agendamento para permitir que os teatros sejam usados para sua finalidade principal?
Agora que foi entregue o Glória Rocha, já se iniciou se um debate sobre isso, que é uma regulamentação de uso. É uma regulamentação de uso que os artistas, através do Conselho de Política Cultural, também ajudaram a elaborar.
Mas isso já está em vigor?
Não. A gestão que passou não chegou às vias de fato de publicar isso.
Deve ser publicado em breve?.
É isso. Então eu preciso ver em que situação está, onde está para dar prosseguimento.
Além do Glória Rocha e do Polytheama, existe desvio desse tipo de função em outros locais?
Não. É lá que a demanda é realmente grande.
Por exemplo, se você pega uma escola de música, é um debate interessante. A princípio, pensamos: “Que legal, uma escola de música fazendo uma audição no final do ano, com crianças de 12 anos subindo no palco.” Aquilo fica gravado na memória para sempre. Eu não esqueço o dia em que subi no palco do Glória Rocha, quando cheguei aqui, com 18 anos de idade, ainda amadora, e subi naquele palco. Foi um momento marcante.
Então, quando olhamos por esse ângulo, podemos até entender que tudo poderia ser feito ali, porque uma escola de música também é arte. Mas se começarmos a pensar na quantidade de escolas de música e dança, e destinarmos os espaços para essa finalidade, chegamos ao final do ano, em novembro e dezembro, só com esse tipo de atividade.
Falta palco para o artista profissional?
Exato.
Uma boa saída é a utilização aqui (Espaço Expressa), até porque aqui não há tanta procura.
Por quê?
Bom, aqui temos várias salas que também são utilizadas para atividades artísticas. Não é que vamos desviar a função do espaço, mas como aqui não temos condição de cobrar ingresso e não há controle de entrada, ele foi adaptado para ser um palco bastante interessante, abrindo um novo espaço.
Mas se uma companhia quiser apresentar uma peça aqui e cobrar ingresso, ela não pode. Então, acaba sendo um espaço que é usado menos, mas que ainda tem uma certa flexibilidade. No entanto, à medida que o uso se intensifica, mais uma vez, precisamos priorizar os espetáculos artísticos.
O que mais precisa mudar?
Eu tive uma reunião com os diretores e uma conversa com os artistas, em que falei para eles algo importante: o nosso foco, embora a gente tenha que gerir contratos de limpeza, questões de manutenção e coisas que não têm a ver com a arte, é realmente entregar a arte.
O que eu disse foi que todo mundo precisa ter uma visão geral do que representamos. Muitas vezes, cada um está em sua parte e desconhece o trabalho do outro, né? Por exemplo, quando fazemos a Festa da Uva, o financeiro corre como louco para organizar as contratações, e as pessoas entram em contato com os artistas. É aquele trabalho burocrático.
É muito bom que todos tenham a oportunidade de participar do evento e ver o fruto do seu trabalho naquele momento apoteótico, onde você vê as pessoas felizes com aquilo que ajudou a fazer. Acho que isso gera um sentimento de pertencimento e pode fazer com que as pessoas se sintam mais felizes no trabalho delas. Acho isso algo bem legal, uma maior integração e uma visão mais humanizada.

Tenho sentido uma certa, não sei se a palavra é correta, distensão. Parece que o ambiente na cidade, e também entre os funcionários públicos, está mais leve. Aqui, por exemplo, me parece mais tranquilo. É uma impressão minha ou isso realmente está acontecendo?
Eu não posso falar pela cidade como um todo, mas vou comentar sobre o que percebo aqui, no quadro de diretores. Temos quatro diretores que são servidores públicos de carreira e dois que vêm de fora.
Um exemplo é o Maurício Ferreira, que tem anos de dedicação a um trabalho incrível de preservação da história. Ele mesmo comentou comigo que possui um arquivo maior do que o próprio acervo do Centro de Memória. Talvez até maior do que o que restou dos arquivos do JJ (Jornal de Jundiaí) ou do JC (Jornal da Cidade), não sei ao certo. Ele já vinha fazendo esse trabalho de forma voluntária e apaixonada.
Temos também o Fernando Aranha Peixe, arquiteto, que está à frente do patrimônio histórico. Já o Willian Ramos, diretor de Cultura, é servidor de carreira que começou na Cultura e tem uma vivência enorme na área. Ele conhece profundamente o que faz. O Paulo Galvão, na Diretoria de Planejamento, Gestão e Finanças, já trabalhou aqui e também no Paço, acumulando uma vasta experiência, essencial para lidar com a gestão financeira.
A Isabel Soares, outra servidora de carreira, assumiu a direção do Espaço Expressa. E o Carlos Pasqualin, que será o diretor dos teatros, é um ator muito conhecido e respeitado pela classe artística.
Aqui, no nosso ambiente, sinto essa distensão, sim, e acredito que isso se deve à política de valorização dos servidores. O Gustavo Martinelli sempre destacou a importância disso, e eu compartilho dessa visão. Os servidores públicos são os que realmente fazem a máquina pública funcionar. Eles têm o know-how necessário. Valorizar esses profissionais e colocá-los em posições estratégicas aumenta a eficiência do serviço público.
Infelizmente, existe uma visão equivocada sobre o funcionalismo público, como se fosse composto por pessoas que não trabalham ou não produzem. Isso não é verdade. Há casos isolados, claro, mas também existem muitos servidores altamente comprometidos.
Quando você dá a esses servidores a oportunidade de ocupar cargos de liderança e gestão, isso muda o ambiente. Eles passam a sentir que podem crescer, que têm chances reais de alcançar esses postos. Essa percepção faz toda a diferença e contribui para um ambiente mais leve e motivador.
É o seu caso também, 37 anos como servidora pública, e agora voltou para a ativa?
Certamente. Sabe, eu costumo dizer que saí da Prefeitura, mas a Prefeitura não saiu de mim.
Sabe por quê? Para mim, foi um privilégio ser servidora pública. Tudo o que fui e o que essa vivência me proporcionou… Quando comecei a trabalhar no esporte e na cultura, o contato com as pessoas me abriu a cabeça de uma forma surpreendente, porque eu era uma pessoa fechada, meio tímida.
Eu era fechada no meu casulo. Essa convivência com as pessoas, esse calor humano, trazem algo especial, mesmo sem dizerem nada. Por exemplo, na época das festas que organizávamos, como a Festa da Primavera, era algo maravilhoso. As famílias iam, com as crianças, os pais, os avós… Ver tudo aquilo acontecer pelas minhas mãos era uma realização que não tem preço.
É por isso que digo que foi um privilégio ter a oportunidade de viver o que vivi no serviço público. Quando deixei o serviço, percebi que tudo o que construí e aprendi nessa vivência não podia ficar guardado comigo.
Sinto que tenho a obrigação de compartilhar. Foi isso que me motivou a atuar no Conselho de Política Cultural.
Como a sua longa experiência como artista influencia o seu trabalho agora que você está à frente da pasta de Cultura?
Olha, a verdade é que a minha experiência como artista está numa área específica, que é a música.
Quando você pensa em gerir cultura, está lidando com um leque muito amplo de linguagens. Mas posso dizer que minha experiência como produtora cultural me traz, sim, uma bagagem importante. Como produtora, você compreende melhor as etapas da cadeia produtiva, o que está mais próximo de gerir.
O artista, em geral, tem limitações para organizar e gerenciar sua própria carreira, sua imagem ou até mesmo para participar de editais, porque são coisas muito distintas. Criatividade não combina com burocracia, e encontrar as duas coisas na mesma pessoa é algo raro.
Eu concentro essas duas habilidades, mas vou te dizer: se eu pudesse ter sido só artista, eu teria sido. Não foi possível porque eu precisava de um porto seguro, entende? Isso é algo que eu aconselho aos artistas que estiverem me ouvindo: continuem fazendo sua arte, mas procurem uma fonte de receita ligada à arte que não dependa só de shows ou espetáculos. Por exemplo, um músico pode ter um estúdio de gravação, criando um plano B.
A verdade é que viver de arte não é fácil. Não quero desmotivar ninguém, mas poucos conseguem alcançar um nível de estabilidade. Vou dar um exemplo: Angela Ro Ro, um grande nome. Durante a pandemia, ela chegou a falar publicamente que estava sem um tostão, fazendo lives e pedindo ajuda financeira. Isso mostra como é uma luta constante.
Situação difícil…
Então, um exemplo bem básico disso é o artista. Ele precisa ter juízo, porque um dia vai ficar velho, e quando isso acontecer, é importante ter um plano. Por exemplo, na área da música, existe um confronto de gerações. Para eu me inserir no mercado hoje e cantar nas baladas, o que eu gosto de cantar não serve, entende?
Mudou cenário?
É, banquinho e violão estão por fora. Um cantinho, um violão, isso já era. Então, se eu quiser me inserir em certo nicho de mercado para ganhar dinheiro, vou ter que cantar sertanejo, né? É por isso que eu digo que não vou falar a minha idade, né? Mas a verdade é que a gente precisa pensar no futuro.
Não é abandonar a arte, mas ter a visão de que, ao chegar numa certa idade, é importante ter uma estrutura de vida.