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Justiça climática exige novo modelo de cidade, diz Rodrigo Faria

A crise climática não pode ser enfrentada sem uma transformação profunda na forma como as cidades são pensadas e organizadas.

Para o advogado e urbanista Rodrigo Faria, diretor executivo do Instituto Pólis, enfrentar as mudanças do clima exige mais do que soluções técnicas: requer reconhecer que o território brasileiro é marcado por desigualdades estruturais que colocam populações inteiras em situação de vulnerabilidade ambiental e social.

“Não se faz justiça climática com o mesmo modelo de cidade que gerou as injustiças sociais que já vivemos”, afirmou Faria durante palestra na Semana Ecos da Floresta, em Jundiaí. “É preciso repensar radicalmente os modos de ocupar o território.”

Doutor em planejamento urbano, Rodrigo cresceu na periferia de São Paulo e atua hoje em conselhos nacionais e municipais ligados a políticas públicas, com passagem pela ONU como assessor de direitos à moradia.

Na palestra, ele fez um chamado à revisão dos planos diretores, alertando que muitos deles seguem uma lógica de exclusão social, mesmo quando revestidos de linguagem técnica ou sustentável.

“O plano diretor é uma ferramenta de disputa. Ele pode reforçar desigualdades se estiver voltado apenas para os interesses do capital imobiliário. Mas também pode ser um instrumento de inclusão, se conectado com os direitos dos povos e territórios”, disse.

O território como espelho da desigualdade

Rodrigo defende que o planejamento urbano deve partir do reconhecimento da realidade: o acesso desigual à cidade. Para ele, não se trata apenas de reformular legislações, mas de entender os sentidos simbólicos e afetivos dos lugares.

“As pessoas não vivem em vetores, eixos ou macrozonas. Elas vivem em bairros, em comunidades com histórias, saberes e pertencimentos. Ignorar isso é perpetuar uma lógica de cidade pensada para poucos”, afirmou.

Segundo o especialista, a desigualdade ambiental no Brasil tem cor, classe e gênero.

“As áreas de risco, sem infraestrutura, com alta exposição a eventos extremos, são ocupadas majoritariamente por pessoas negras, pobres, muitas vezes mulheres chefes de família. Isso não é aleatório, é um projeto histórico de segregação.”

Integração territorial e justiça intermunicipal

Ao abordar o caso do rio Jundiaí, que cruza diferentes municípios, Rodrigo criticou a fragmentação do planejamento urbano.

“Cada cidade tem seu plano diretor, mas o rio não reconhece fronteiras administrativas. As decisões de um município impactam os demais. A bacia hidrográfica precisa ser vista como unidade de planejamento”, explicou.

Para ele, a governança territorial exige articulação entre municípios, especialmente em regiões metropolitanas.

“A lógica federativa brasileira dificulta, mas precisamos de pactos interfederativos para enfrentar os desafios comuns, principalmente os relacionados à água, à mobilidade e à habitação.”

Racismo ambiental e o direito à permanência

Rodrigo também chamou atenção para o que classificou como “racismo ambiental”, conceito que se refere à maior exposição de populações negras e periféricas a riscos ambientais.

“Quando se constrói um parque, mas se remove a comunidade que ali vive, isso não é sustentabilidade, é uma violência disfarçada de verde.”

Ele defende o direito à permanência como princípio da justiça climática.

“É preciso proteger as pessoas que já vivem em territórios de interesse ambiental, garantindo infraestrutura, regularização fundiária e reconhecimento cultural.”

Caminhos possíveis

Ao fim da palestra, Rodrigo apontou caminhos para cidades mais justas e resilientes: fortalecer o orçamento participativo, ampliar os instrumentos de controle social sobre os planos diretores, reconhecer os saberes populares no desenho das políticas públicas e construir soluções com – e não para – as comunidades.

“Não vamos resolver a emergência climática com startups ou aplicativos. Precisamos de democracia radical, de escuta ativa e de políticas construídas a partir do chão da cidade.”

A Semana Ecos da Floresta reuniu em Jundiaí especialistas de diversas áreas para debater os vínculos entre natureza, cidades e justiça socioambiental.

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