Por David Korten | 27 de janeiro de 2025
Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo chegou a um momento significativo de oportunidade, quando a descolonização gerou um surto temporário de democracia global e um impulso para criar e compartilhar a prosperidade de forma equitativa em escala mundial. O compromisso com o desenvolvimento econômico trouxe a esperança de que ativos e poder seriam, dali em diante, compartilhados democraticamente.
Os aspirantes a autocratas reagiram. Eles recorreram a estatutos corporativos, dívidas e outros instrumentos financeiros para reafirmar o controle autoritário sobre os ativos que os governantes coloniais haviam sido forçados a ceder.
Em vez de buscar a orientação de uma verdadeira eco-nomia, dedicada ao cuidado com a Terra e uns com os outros, muitos de nós sucumbimos às falsas promessas dos economistas neoliberais. Apresentadas como ciência neutra em valores, suas teorias exaltavam os benefícios do “mercado livre”, no qual competimos para explorar uns aos outros e a Terra, na busca por maximizar retornos financeiros individuais. Garantiram-nos que isso promoveria o bem-estar de todos. O resultado previsível foi a substituição da opressão do colonialismo tradicional pela opressão do capitalismo contemporâneo.
Desde o início do século XXI, empresas como Google, Microsoft, SpaceX, Tesla, Amazon e Meta acumularam um imenso poder financeiro para seus principais executivos e proprietários. Esse poder financeiro, combinado com o controle da informação e da infraestrutura digital, transforma a democracia em uma mera fachada e impulsiona a desigualdade a níveis cada vez mais obscenos.
Os predadores financeiros chamam o dinheiro — um mero número criado do nada — de riqueza e fazem do crescimento desse dinheiro a prioridade humana absoluta. Os meios de comunicação que controlam chamam especuladores financeiros predatórios, que criam ativos fictícios, de investidores. Os ricos ficam mais ricos e mais arrogantes à medida que sua fortuna e poder se tornam cada vez mais obscenos.
A Oxfam relatou, no início de 2024, que, desde 2020, os cinco homens mais ricos do mundo mais que dobraram suas fortunas combinadas, de US$ 405 bilhões para US$ 869 bilhões. Em média, cada um acumulou US$ 174 bilhões em ativos financeiros, e seus patrimônios cresceram a uma taxa de US$ 14 milhões por hora.
Para entender essa cifra, considere que US$ 1 bilhão equivale a mil milhões de dólares. Segundo o The Cap Times, uma pessoa com um salário de US$ 75 mil por ano teria que trabalhar mais de 13.000 anos para alcançar US$ 1 bilhão em renda total.
Atualmente, a população mundial é de 8,2 bilhões de pessoas. O Banco Mundial estima que 44% (3,6 bilhões de pessoas) vivem abaixo do limite de extrema pobreza para países de renda média-alta, que é de US$ 6,85 por dia. Esse valor é menor do que o custo de um cheeseburger do McDonald’s com uma xícara de café. Pode ser suficiente para um almoço para uma pessoa. Mas sem café da manhã. Sem jantar. Sem moradia. Sem família. Sem assistência médica. Sem educação.
Essas 3,6 bilhões de pessoas têm um problema sério. Mas podemos dizer o mesmo de alguém que precisa de US$ 14 milhões por hora para ter uma vida satisfatória.
Nenhuma sociedade que permite níveis obscenos tanto de pobreza quanto de riqueza pode se considerar civilizada. Embora alguma desigualdade seja inevitável, o nível atual excede a compreensão humana. Ele reduziu a maioria da população mundial a uma forma moderna de escravidão, com bilionários agindo como senhores entusiasmados.
Bancos privados e outras corporações voltadas à maximização de lucros são as principais armas institucionais dos bilionários. Eles também usam o poder de seus meios de comunicação para desviar a indignação gerada, fazendo com que os mais pobres se voltem uns contra os outros, em vez de contra eles.
Agora, enfrentamos uma nova administração nos Estados Unidos, composta por bilionários, dedicada a usar o controle do governo para expandir ainda mais seus interesses financeiros.
Após o presidente Biden alertar sobre a ascensão da oligarquia, as buscas no Google pelo termo “oligarquia” dispararam. Assim como em 1995, quando houve uma conscientização sobre os perigos das corporações transnacionais, agora há uma tomada de consciência sobre os perigos da oligarquia — quando alguns dos bilionários mais ricos do mundo governam o planeta.
Os bilionários que assumiram o controle do governo dos EUA nos alertam para uma verdade evidente: a redistribuição de suas riquezas deve se tornar a grande prioridade do nosso tempo. Como fazer isso?
Aqui estão quatro prioridades globais essenciais para um futuro humano viável e inclusivo:
Implementar políticas fiscais agressivas para capturar e redistribuir a riqueza dos bilionários, financiando programas que elevem a base da sociedade e regenerem o planeta. O objetivo é uma sociedade global na qual todos tenham um meio de vida digno e ninguém tenha poder para explorar os outros.
Substituir corporações voltadas ao lucro máximo por instituições que compartilhem o poder entre indivíduos comprometidos com o bem-estar coletivo. Um modelo promissor é a cooperativa de trabalhadores Mondragón, na região basca da Espanha, onde cada trabalhador possui uma única cota, que só pode ser revendida para outro trabalhador da cooperativa.
Transferir para propriedade pública ou comunitária os bancos com fins lucrativos e outras instituições financeiras autorizadas a emitir moedas, criptomoedas e derivativos financeiros.
Aplicar um imposto sobre transações financeiras para desencorajar a especulação predatória.
Não há espaço neste mundo para bilionários ou corporações cujo único objetivo é explorar a Terra e seu povo para enriquecer ainda mais os já mais ricos.
Embora essas reformas essenciais não sejam fáceis de alcançar, o primeiro passo é reconhecer que todas são possíveis e cumprem uma função pública essencial. Já passou da hora de colocá-las na agenda para análise e debate público.
Chegamos a um ponto de escolha, que nos chama a enfrentar nosso problema com os bilionários. Aqueles que fizeram do dinheiro o propósito de suas vidas tomaram o controle de nossas instituições de governança.
Mas nós, povo da Terra viva, temos o direito, os meios e o poder de retomar o controle para garantir o bem-estar da vida.
Devemos falar a verdade para os legisladores, defender as mudanças necessárias, nos engajar na conversa e tomar decisões pessoais que exemplifiquem as transformações que buscamos.
O momento é agora.
Nós somos aqueles por quem estávamos esperando.
David Korten
David C. Korten é um autor americano, ex-professor da Harvard Business School, ativista político e crítico da globalização corporativa. Ele se define como um estudioso de psicologia e sistemas comportamentais. Sua publicação mais conhecida é “When Corporations Rule the World” (Quando as Corporações Governam o Mundo).