Quinta-feira, 27 de outubro de 2022.
No artigo que escrevi aqui mesmo no Oa na segunda-feira, 3 de outubro, no dia seguinte das eleições do primeiro turno, anotei, entre outras coisas o seguinte:
(…) “o que considero realmente fundamental é: se a frente de esquerda quiser ter a vitória no segundo turno, terá que ser capaz de colocar o bloco na rua. Algo bem mais consistente, poderoso e mobilizador do que se viu na avenida Paulista no domingo”.
E hoje, 24 dias depois, o que se vê é uma frente de centro-esquerda e uma mobilização considerável nas ruas mas, especialmente no mundo digital. Pela primeira vez, desde as eleições de 2018, a guerra de narrativas antes dominada pela extrema-direita está tendo um contraponto à altura.
Os acontecimentos da semana, a começar pelo caso Roberto Jefferson e, a seguir, com a denúncia furada das rádios do nordeste, guarda ainda suspense – escrevo no amanhecer do dia. O que será que ainda virá hoje?
Serão revelados arquivos de Gustavo Bebianno? O que quer dizer o presidente ao dizer que vai às últimas consequências?
Enfim, as informações estão disponíveis em todos os meios possíveis para que qualquer um tenha acesso e tire suas próprias conclusões.
Um fato que considero especialmente relevante é a quantidade de pessoas nas redes sociais manifestando sua posição política, declarando seu voto. O momento é dramático para a democracia e, muitos compreendem a gravidade da situação.
Como muito já se disse, o que está em jogo não é apenas a eleição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou a reeleição do atual, Jair Messias Bolsonaro. Estamos falando da manutenção do Estado Democrático de Direito, na garantia de continuar a ter um país onde seja possível, pelo menos, eleger nossos representantes.
A máquina de propaganda da extrema-direita é poderosa e global – o Brasil é parte importante da estratégia. Por isso a eleição de domingo não é apenas uma eleição brasileira, é um pleito onde forças poderosas se enfrentam.
Eu pude acompanhar todo o período da Ditadura, fui com a bandeirinha a mão e uniforme escolar ver o ditador de plantão desfilar em Sete de Setembro. Senti medo muitas vezes ao ver os camburões rondando pela cidade, participei de passeatas e mobilizações no final da década de 70, início do processo de redemocratização.
Não estou falando de livros. Vivi, senti.
No início dos anos 80, já trabalhando em jornais, acompanhei a campanha das Diretas, onde uma frente democrática jamais vista antes se formou com o objetivo de garantir eleições livres. Emenda derrotada, mas seu propósito continuou presente.
Por vezes estive a trabalho em Brasília durante a Assembleia Nacional Constituinte.
Ouvi atento, pela tevê, o discurso histórico de Ulysses Guimarães:
“Quanto a ela, discordar, sim. Divergir, sim. Descumprir, jamais. Afrontá-la, nunca”, “Traidor da Constituição é traidor da pátria. (…) Temos ódio à ditadura. Ódio e nojo. Amaldiçoamos a tirania onde quer que ela desgrace homens e nações. Principalmente na América Latina.”
Repito aqui: Temos ódio à ditadura. Ódio e nojo.
Jair Messias Bolsonaro, o atual presidente, é a conexão direta com a Ditadura. Por mais de 30 anos, ele conspirou contra o Brasil democrático. E continuou fazendo o mesmo durante os quatro anos na Presidência.
Por isso, ao ver pessoas que ainda o defendem, preciso de uma dose extra de compreensão. Lamento, mas prefiro enxergar a realidade do que imaginar um país que não existe ainda.
O Brasil do Estado Democrático de Direito é uma obra em construção. Demos um pequeno passo ao formalmente promulgar a Constituição de 88 e a partir daí conseguir, ao menos, eleger os governantes, mas falta muito.
Pensar que em 17 de abril de 2016, o atual presidente, então um obscuro deputado do baixo clero, ao declarar seu voto a favor do impeachment de Dilma Rousseff, fez uma homenagem ao coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, declarado torturador pela Justiça.
Esse é o Brasil real.
O defensor do torturador não foi preso e nem respondeu a processo algum. Ao contrário, tornou-se presidente e agora disputa a reeleição.
É por essa e por tantas outras que o Brasil precisa acertar as contas com seu passado, rever seu presente e construir seu futuro. Um futuro de país soberano, onde a vontade do povo prevaleça e as decisões sejam tomadas para beneficiar quem aqui vive.
Como muitos compreenderam, votar em Luiz Inácio Lula da Silva no domingo não é votar no PT apenas, mas numa ampla frente cujo compromisso é a manutenção da democracia e do direito das pessoas de decidir qual o futuro que queremos.
Foto de abertura: EBC
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